As paredes continuavam encardidas de nós e o chão preso aos cadarços que criamos. Pode-se achar estranho isso, mas realmente parecia que a nossa casa arrebentaria e abriria um abismo entre nós. Eu estava de fato desatando esses “nós” e voava tão alto sobre esse abismo que não me importava em cair. O erro começa sempre depois de suscetíveis acertos e tem hora, convenhamos que fazer as coisas certas é um pé no saco, o meu foi chutado algumas centenas de vezes, só pra esclarecer. Eu tinha dezessete motivos para amá-la e não sobrou um sequer pra fazê-la pensar em como seria bom uma possível volta, sabe como essas coisas são, o tempo vai passando, passando e a nossa cabeça vai ficando cada vez mais orgulhosa.
Tentei inúmeras vezes convencê-la de que foi apenas um deslize, apenas um, mas ela é difícil de convencer do contrário, é irredutível quando se toma uma decisão, principalmente, pra sua vida ou pra sua morte. Supliquei tantas vezes que me perdoasse, surrei tanto minha cabeça contra a parede para fazer que meus miolos se reagrupassem, como uma forma de autopunição, mas nem o sangue, nem a dor de se rachar aquilo que me comanda foi o suficiente para fazê-la reabrir o seu peito. Tudo o que mais queria era o seu perdão, mas era como se tivéssemos caído em uma gravidade horizontal oposta. Sem ela parece que sou metade em tudo e no que se diz respeito às estrelas a minha parece que perdeu a luz e inebriou-se de vazio. Não sinto vergonha de dizer que toda a minha luz provinha dela, mas sinto orgulho de dizer que pequei em não dar o devido valor na hora certa.
Parecia um dia tão fútil quanto todos os outros na minha vida, os relógios continuavam batendo seus ponteiros sobre a minha cabeça, enquanto lá fora o mundo atravessava seu corriqueiro caos de pernas e carros. Nada que eu não estivesse prontamente acostumado. Quando mais acho que estou certo sobre algo, mais desesperadamente preciso procurar algo para me amordaçar. Acho que a rotina estava me matando paulatinamente, não estava tão feliz como antigamente, estava tão triste como uma nuvem de chuva em época de estiagem. Eu queria quebrar esses conceitos, esses pudores, queria viver algo novo sem me esquecer de quem de fato eu amava. Suplicava por debaixo dos panos um caso, uma amante, uma coisa que me trouxesse de volta pra casa, para a minha mulher. Era como se Deus tivesse me ouvido e prontamente colocado sua melhor moldura, sua melhor modelagem, em minhas mãos para eu poder brincar e me acostumar com o distante.
Sua inteligência, sua astúcia e sua beleza eram coisas que não podiam ser prontamente entendidas, deviam ser devoradas e engolidas a seco. Foi, de fato, o que fiz. Alguma coisa nela, alguma magnitude, alguma coisa que eu não era capaz de resistir, parecia querer me puxar para o fundo daquele seu vestido. Seu cheiro me hipnotizava e seu nome me lembrava nome de pedra preciosa... Não demorou muito para que eu provasse das suas garras, que me deleitasse com elas rasgando minha pele, foi como se sua alma tivesse impregnado na minha. A suntuosidade das suas curvas, o deslize macio da sua pele e a quentura do seu corpo marcou-me muito mais do que uma simples foda. Eu estava amando pela segunda vez a minha própria mulher, amando uma que ela não orgulhava nenhum pouco em ser.